Lei das Cotas
Raciais ‘é anacrônica’, alerta pesquisador
O projeto de Lei aprovado pelo Senado
que estabelece as cotas sócio-raciais seguirá à sanção da presidenta Dilma
Rousseff mas, na opinião de um dos autores do Programa de Ações Afirmativas da
Universidade de Brasília (UNB), da forma que foi concebida, a nova Lei
representará um enorme retrocesso ao dividir a comunidade negra. Segundo o
Supremo Tribunal Federal (STF), a mais alta Corte do país, reconhecer que “não
precisa dividir” porque ser negro no Brasil representa, por si só, uma
desvantagem.
Na opinião é do professor José Jorge de
Carvalho, do Departamento de Antropologia da Universidade de Brasília e pesquisador
do CNPq, em entrevista à última edição da revista semanal de esquerda Caros
Amigos, o projeto aprovado pelo Senado cria as chamadas cotas sócio-raciais, ao
reservar 50% das vagas para estudantes oriundos da escola pública; destes 50%
devem ser reservadas aos estudantes de famílias com renda per capita de 1,5
salário mínimo; e os outros 50% entre negros e indígenas proporcionalmente à
presença de cada um desses segmentos em cada Estado da Federação, de acordo com
o Censo do IBGE 2010.
– A Lei é anacrônica. A história vai
responsabilizar as lideranças negras que participaram desse retrocesso. Como o
senador Paim, que tem assessores parlamentares afinados com esse tema, não
lutou para desvincular as cotas sociais? Sarney virou paladino dos negros
brasileiros? A elite branca racista brasileira entregou os anéis para não
entregar os dedos – ironizou.
Segundo afirmou José Jorge de Carvalho,
a principal função da Lei “é conter a parte mais poderosa, a vanguarda do
Movimento Negro”.
– Simplesmente, a Lei conteve a parte
mais poderosa do Movimento, decapitou a comunidade negra. Os filhos dos
empresários da Fiesp estudam na Universidade de S. Paulo (USP), na Universidade
de Campinas (Unicamp). Os filhos dos empresários da Firjan, do Rio, também estudam
nas melhores universidades públicas. Nossa luta sempre foi para que os filhos
do Pelé tivessem os mesmos direitos dos filhos da faxineira e todos pudessem
estudar – acrescentou.
José Jorge também critica o fato de o
Senado ignorar, durante a tramitação da Lei, a experiência acumulada por 129
universidades que já adotam ações afirmativas por decisão de instâncias
internas. Citou o caso das 51 que adotam cotas e lembrou que, destas, 46
instituições têm modelos diferentes.
– Das 51 universidades federais que têm
cotas, 46 têm modelos diferente. Cada universidade que aprovou (o sistema de
cotas), procurou fazê-lo de forma diferente das anteriores. Foi resultado
sempre de uma negociação por parte dos Conselhos. Uma variedade de sistemas. A
Lei simplifica o raciocínio. A massa crítica que gerou a luta pelas ações
afirmativas não pode influenciar o Congresso. Todas as audiências foram
inúteis, foram inférteis, dissociadas de reflexão. Toda a inteligência gerada
pela sociedade foi desprezada, considerada irrelevante – frisa.
De acordo com o professor da UnB, a luta
por cotas é uma luta política.
– Para que lutamos durante mais de uma
década? Para que existissem cotas para negros, para empoderar a comunidade
negra. A luta por cotas raciais é uma luta política. A opção de colocar negros
de baixa renda ou negros da escola pública é uma medida de contenção da
comunidade negra. Querem dizer que apenas aceitam apoiar, reconhecem direito à
proteção pelo Estado da parte mais frágil da comunidade negra – concluiu.
FONTE: CORREIO DO BRASIL
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