"Café do
Cerrado Mineiro"
Por Xico
Graziano
O terroir chegou ao café. Termo
característico da viticultura, o atributo da origem, única e delimitada, anima
a cafeicultura nacional. Exigentes consumidores da bebida, especialmente do
expresso, agradecem. Qualidade certificada não tem preço.
No centro desse virtuoso processo no
campo se encontra a Federação dos Cafeicultores do Cerrado, com sede em Monte
Carmelo (MG). Ali, ao nordeste do Triângulo Mineiro, se desenvolve um modo de
produção peculiar, diferente dos tradicionais cafezais. Os agricultores contam
com a vantagem da boa altitude das terras, essencial para a qualidade do café.
Mas, além disso, eles cultivam "café com atitude". Não se trata de
mero jogo de palavras.
Sabe-se que as plantações em terrenos
elevados, entre 800 e 1.300 metros, ganham vantagens na formação e no
amadurecimento dos grãos de café. O frescor noturno, contraposto aos dias
ensolarados e quentes, melhora a bebida, deixando-a mais encorpada, com aroma
intenso. Historicamente, locais de excelente clima e altitude foram
aproveitados nas encostas da Serra da Mantiqueira, em lavouras distribuídas
pelas belas montanhas entre São Paulo, Minas Gerais e Espírito Santo.
Mais recentemente, de forma inusitada,
também se descobriram vantagens agronômicas nas chapadas de altitude, próprias
do cerrado brasileiro no Centro-Oeste. Assim, subindo até o Oeste da Bahia, uma
nova cafeicultura começou a ser configurada. Seus produtores contam não apenas com
a sorte da natureza - terras planas, solo profundo, elevada altitude, clima
ameno -, mas investem firmemente na tecnologia do café. Aqui mora a diferença.
Começa na origem dos cafeicultores. Ao
contrário das antigas regiões agrícolas, que se apegam ao passado e,
naturalmente, tendem à acomodação, o Cerrado recebeu jovens empresários rurais,
aventureiros da terra, que romperam suas origens familiares para abrir as
fronteiras da Nação. Recebendo forte apoio da pesquisa agronômica, sua ousadia
produtiva venceu obstáculos, quase dogmas agrícolas, criados pela cultura da
"terra roxa" na faixa litorânea da Mata Atlântica.
Um "DNA de inovação" carregam
os produtores rurais do Cerrado mineiro, conforme diz Francisco Sérgio de
Assis, operoso presidente da federação, que agrega 2.500 cafeicultores. Estes
se espalham por 55 pequenos, e prósperos, municípios mineiros, identificados
pela origem geográfica comum. Exemplo da nova geração do campo, Serginho fugiu
das geadas do Paraná, sua origem, para domar o desconhecido Cerrado.
Protagonizou, num quarto de século, uma extraordinária história de sucesso.
Epopeia rural.
A cafeicultura do Cerrado mineiro,
atualmente com 170 mil hectares ocupados, vestiu, desde o seu nascimento, nova
roupagem tecnológica. As distintas condições de solo e clima, somadas à falta
de mão de obra, exigiram romper com padrões tradicionais da cafeicultura. A
colheita é basicamente mecanizada. Terrenos planos favorecem a operação das
enormes máquinas, que se sobrepõem às linhas do cafezal vibrando suas hastes
para causar a derriça dos grãos. Impossível nas montanhas.
Na época seca do ano, os cafezais
recebem irrigação, seja por gotejamento rasteiro, molhando as raízes debaixo da
copa, seja por aspersão, esguichando por cima das plantas. Ninguém desperdiça
água por lá. Adubação, química e orgânica, mais o controle fitossanitário são
impecáveis. Colhido com baixa umidade, sem chuvas, os grãos não
"ardem" no terreiro. O pacote tecnológico custa caro, mas assegura
alta produtividade e boa qualidade. A bebida do café resulta levemente
adocicada, às vezes achocolatada, longa finalização na boca. Típica do Cerrado
mineiro.
Nessa quebra de paradigma promovida pelo
Cerrado mineiro se destaca a organização dos produtores. Estruturados em sete
associações e oito cooperativas, mais um órgão de pesquisas, todos se aglutinam
na Federação dos Cafeicultores. Esta controla os programas de certificação e de
sustentabilidade no campo. Seu orçamento se origina no recolhimento de 25
centavos de real por saca comercializada, quer dizer, eles tiram dinheiro do
bolso para executar sua estratégia. Merecidamente, receberam a primeira
certificação por origem geográfica no Brasil, cuja marca se grafa nas sacas de
café vendidas mundo afora.
Curioso anda o ranking nacional do café.
O Estado de Minas Gerais firma-se, de longe, como o maior produtor brasileiro,
responsável por 52,7% da colheita, seguido pelo Espírito Santo, com 24,2%. São
Paulo ocupa, bem abaixo, o terceiro lugar e, pasmem, as lavouras do Oeste da
Bahia já ultrapassaram o Paraná na quarta posição. Brigando pelo quinto lugar
se encontra, acreditem, Rondônia. Caminhos da lavoura cafeeira.
No território mineiro, dentre as três
regiões produtivas - o Sul de Minas, a Zona da Mata e o Cerrado -, este
responde por apenas 22% da produção estadual. Perde, em quantidade, das regiões
tradicionais. Gaba-se, porém, pela qualidade. Com razão. A bebida originada nas
lavouras do Cerrado mineiro, duplamente certificada, com selos de origem
geográfica e de sustentabilidade, começa a dominar o mercado externo. No Japão
as butiques de café o vendem, cada xícara, pelo equivalente a R$ 15.
Sempre se afirmou, com certa razão, que
o Brasil exporta o melhor café, torrando no mercado interno o restolho. A
situação já melhorou muito, depois que a Associação Brasileira da Indústria de
Café (Abic) lançou seu selo de garantia, puxando a qualidade para cima. Depois,
com o expresso, os cafés especiais se destacaram. Agora, chegou o lance
decisivo: a certificação do café. Minas Gerais saiu na frente.
Milton Neves, famoso comunicador da área
do futebol, que anda se aventurando na cafeicultura, gosta da jogada. Gol de
placa no café!
Saiba mais sobre o autor desse conteúdo:
Xico Graziano São Paulo - São PauloConsultoria/extensão
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