UM VESÚVIO DE
VERDADE E A RUA LURDES E EMÍLIO MARON
Jorge Amado, em dado momento, externou
reflexões que o levaram a se arrepender por posições que assumiu em sua
trajetória, inclusive quanto ao discurso político contido na primeira fase de
sua obra literária, ao qual chamou de "horroroso".
Na esteira de seus arrependimentos,
certamente, àquela altura da vida, refletindo sua trajetória, quem sabe Jorge
Amado incluísse, também, um pedido de desculpas pelo que se sucedeu ao casal
Emílio e Lurdes Maron, após tê-los estereotipado como Nacib e Gabriela, o
bullying literário e literal que lhes tirou a graça da vida, expostos ao senso
de uma sociedade conservadora, pela insinuada suposta prática de adultério.
Enquanto para muitos a Gabriela
representava conquistas feministas, nessa aldeia ilheense a vergonha avariava o
casal e a família Maron. A exímia cozinheira dos quitutes inigualáveis, que deu
ao quibe do Maron o toque brasil/nordeste, perdeu o prazer de conviver nessa
cidade.
Hoje, Ilhéus comemora um Vesúvio que se
revigora a cada nova iniciativa, contendo o predicado de, pela obra de Amado,
ter se tornado mundialmente conhecido. Mas esquece-se que aquela "casa
" nunca fora um fruto do acaso ou do pós Jorge Amado. Aliás, o Vesúvio
sempre sobreviveu sem que o escritor e sua obra pudessem sequer serem citados
em suas proximidades, mas pela excelência de sua cozinha inimitável, da qual a
família ilheense desfrutava. Assim, Emílio e Lurdes criaram filhos e amealharam
alguns bens. O quibe do Vesúvio, no meu tempo, era o quibe do Bar Maron, de
Dona Lurdes Maron. Quando ía a casa dos meus avós, e isso era quase diário,
sempre cruzava com ela, sentada numa cadeira diretor de lona, à porta do
Vesúvio. Nesse caminho, recebia e retribuía os seus cumprimentos: " Boa
tarde, Alcidinho, como vai Silvinha, e sua avó Hilda? - Bem, Dona Lurdes e a
senhora, vai bem?
Estava falando com ela, a mulher que foi
a inspiração do escritor de Gabriela Cravo e Canela. Lembro de minha mãe
prevenindo: "Meu filho, se alguém mandar você chamar Dona Lurdes de
Gabriela, não faça isso "! Não fiz e não entendia o porquê. Mas outros o
fizeram. Hoje, chamam isso de bullying e quase todos tendem a condenar tal
prática.
Dona Lurdes morreu cedo, uns 50 anos. A
beleza de seus filhos e netos referendam a sua beleza, ainda mais jovem, como
não conheci. Emílio( me chamava de Sabóia), viúvo, passou, posteriormente, o
Bar para o filho Carlinhos e mudou-se para Olivença, onde possuía uma casa.
Carlos Maron colocou, novamente, o nome Vesúvio no bar.
O que foi dissabor trouxe um resultado
nada desprezível para uma Ilhéus, que deve ao sacrifício do casal, Emílio e
Lurdes, os frutos oriundos da obra do talentoso escritor - culturais e
econômicos. Mas devemos às suas memórias, a reverência que, nesse episódio,
dedicamos apenas ao filho mundialmente famoso. O beco do Vesúvio, ainda
denominado Rua D. Eduardo, deveria ter os seus nomes, rua Lurdes e Emílio
Maron. Pois se, hoje, tudo por aqui é Gabriela, tem um quibe e até chocolate do
Nacib, nada mais justo como reconhecimento àqueles que deram ao Vesúvio, O BAR
MARON, o recheio que é, ainda hoje, a alma do lugar. Recheio como o dos quibes
maravilhosos cujo aroma, durante a fritura, inebriava os passantes e os
clientes, que povoa nossa memória e traz-nos a saudade que nos leva a sentar
nas mesas daquela mesma calçada, à procura dos mesmos sabores, como se possível
fosse...
Se um dia me perguntarem, que comida
representa o "prato de Ilhéus ", eu, prontamente, responderia: - O
nosso prato é o quibe, o quibe dos nossos árabes, tantos. Mas especialmente
pelo quibe do Vesúvio, que ainda veremos serem consumidos aos milhares. Não por
causa do maravilhoso sabor, irresgatável, mas pela marca que Emílio e Lurdes
deixaram nos que tiveram a oportunidade de degustar essa inesquecível e
verdadeira experiência.
POR Alcides Krucheswisk
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