CPI do Tráfico
de Pessoas aprova relatório final com proposta de mudança na lei penal
A Comissão Parlamentar de Inquérito
(CPI) que investiga o Tráfico Nacional e Internacional de Pessoas no Brasil,
aprovou, nesta quarta-feira (19), o relatório final elaborado pela senadora
Lídice da Mata (PSB-BA), após vinte meses de trabalho.
O documento conclui pela apresentação de
um projeto de lei que procura adequar a valoração dada pela lei penal
brasileira ao crime de tráfico de pessoas aos termos da Convenção de Palermo,
das Nações Unidas, contra o crime organizado transnacional, ratificado pelo
Brasil em 2003. De acordo com o relatório, uma das falhas da legislação vigente
é vincular o tráfico de pessoas exclusivamente à exploração sexual, deixando de
lado, por exemplo, os casos ligados à remoção de órgãos ou ao trabalho escravo.
Assim, o projeto apresentado define como
tráfico de pessoas a prática de “agenciar, aliciar, recrutar, transportar,
transferir, alojar ou acolher pessoa, mediante grave ameaça, violência, coação,
fraude ou abuso, com a finalidade de explorar alguém para: remoção de órgãos
tecidos ou partes do corpo; trabalho em
condições análogas à de escravo; servidão por dívida; casamento servil; adoção
ilegal; exploração sexual; qualquer forma que acarrete ofensa relevante à
dignidade da pessoa ou a sua integridade física”.
A pena prevista é de prisão, de quatro a
dez anos, e multa. De acordo com Lídice da Mata, a pena se harmoniza com outros
tipos penais de gravidade equivalente, como o tráfico de drogas e de armas. Ela
também apontou que, pelo projeto, o tráfico de pessoas deixa de ser
caracterizado como crime contra a dignidade sexual para ser considerado crime
contra a dignidade da pessoa.
A CPI também aprovou a apresentação de
um projeto de resolução que dispõe sobre a realização de audiências públicas
periódicas com o ministro da Justiça, para prestar esclarecimentos perante a
Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH) sobre diretrizes
e implementação da política sobre o tráfico de pessoas.
A presidente do colegiado, senadora
Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM), cumprimentou Lídice da Mata pelo trabalho
realizado e disse esperar que o projeto de lei sugerido seja aprovado pelo
Senado ainda no primeiro semestre do próximo ano.
- Precisamos urgentemente mudar essa
cultura que não enxerga o tráfico de pessoas como realidade – alertou.
Histórico
Desde abril de 2011, foram realizadas
oitivas e audiências públicas para apurar denúncias de tráfico de pessoas em
Manaus (AM), Salvador (BA), Belém (PA), São Paulo (SP), Rio de Janeiro (RJ),
Natal (RN) e Goiânia (GO). Graças ao trabalho da CPI, vieram a público casos
como o da adoção ilegal de cinco crianças de uma mesma família da cidade de
Monte Santo, na Bahia.
Vindas de uma família em situação de
vulnerabilidade social, essas crianças foram adotadas por famílias do estado de
São Paulo, com a ajuda de intermediários, sem que fossem seguidos os devidos
procedimentos legais. As autoridades foram acionadas e as crianças se preparam
para voltar para casa. Mas esse foi um desfecho que não teve outro caso
investigado pela CPI, também envolvendo crianças, dessa vez em Natal (RN). O
desaparecimento de cinco crianças que, na avaliação das autoridades ouvidas,
pode estar ligado ao tráfico de órgãos, ocorreu entre os anos de 1998 e 2001,
no bairro Planalto da capital potiguar.
Entre seus encaminhamentos finais, a CPI
solicitou o ingresso imediato da Polícia Federal no caso, “tendo em vista o
flagrante desrespeito aos direitos humanos e a inépcia demonstrada pelas
autoridades policiais e judiciais no sentido de dar uma resposta às famílias”.
A CPI também apurou denúncias de tráfico
de trabalhadores rurais de Pernambuco para trabalhar em outros estados, envio
de jovens cariocas para a Namíbia, aliciamento de homossexuais em São Paulo,
entre outras.
“O tráfico de pessoas, que não haja
ilusões, existe e atenta contra os direitos de toda a sociedade brasileira.
Como se vê, pelo que já expomos, além de vitimar mulheres e homens que vivem em
situação de vulnerabilidade dadas as condições peculiares das atividades
profissionais que desempenham, relacionadas à indústria do sexo, o tráfico de
pessoas também entra nas casas, rouba crianças, empobrece o futuro de meninas e
meninos e instala a desesperança e a revolta no seio de famílias que já
enfrentam a necessidade de conviver com privações sociais, políticas e civis
inaceitáveis na era moderna”, disse a senadora Lídice da Mata em seu relatório.
Fonte: Agência Senado
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