Em debate,
militares e parentes manifestam insatisfação com salários e benefícios
Durante audiência pública na Comissão de
Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH), nesta quinta-feira (27),
militares da reserva e familiares de integrantes das Forças Armadas ainda na
ativa falaram das insatisfações com os baixos salários e os benefícios da
carreira.
Os militares cobram, entre outros
pontos, o pagamento de um reajuste salarial de 28% ainda pendente em relação a
diversos subgrupos, referente ao antigo sistema de reajuste na data-base do
período inflacionário. Seria uma dívida salarial já reconhecida pela Justiça,
da ordem de R$ 5 bilhões. Houve ainda apelos pela correção de discrepâncias de
tratamento entre servidores situados no mesmo grau hierárquico.
O senador Paulo Paim (PT-RS), que pediu
a audiência e dirigiu os trabalhos, ao fim se comprometeu em solicitar
audiência com o ministro da Defesa, Celso Amorim, para tratar das
reivindicações. Deverá ainda ser solicitada a presença dos comandantes das três
Forças (o general Enzo Peri, do Exército; almirante Julio Soares de Moura Neto,
da Marinha; e o tenente-brigadeiro do ar Juniti Saito, da Aeronáutica) e de uma
comissão de oito dirigentes de entidades dos militares da reserva e das
famílias dos ativos.
Logo depois da reunião, em entrevista,
Paim informou que a presidente da CDH, senadora Ana Rita (PT-ES), e o senador
Lindbergh Farias (PT-RJ) também se dispõem a acompanhar a audiência. Sobre a
audiência pública, Paim disse que os depoimentos mostraram a existência de uma
situação grave e um clima de insatisfação generalizada.
- É e preciso que se estabeleça um
diálogo com eles – disse.
Para o senador, ficou evidenciada a
necessidade de um plano de reestruturação das carreiras militares, para que
todos possam “viver com dignidade”. Os depoentes citaram a situação de oficiais
com longos anos de serviço com ganho mensal que vai pouco além de R$ 3.500. No
caso de um recruta, o soldo – o nome para os ganhos na área militar - fica
abaixo do salário mínimo.
- Quando mostraram contracheques, vimos
que os salários deles não dão para pagar o aluguel de uma simples morada na
periferia de Brasília, não no Plano Piloto – disse Paim.
Causa Qesa
Ficou também decidido que ainda na
próxima semana deverá ser encaminhado aos comandantes das três Forçase ao
ministro da Defesa um documento com a síntese das reivindicações. A lista
inclui a chamada Causa Qesa (Quadro Especial de Sargentos da Aeronáutica),
reivindicação para que seja estendido a esse agrupamento o mesmo nível de ascensão
funcional assegurado aos cabos femininos que, em 1984, foram promovidas à
graduação de terceiro-sargento, com direito a chegar ao nível de suboficial.
O presidente da Comissão Nacional do
Quesa, Eduardo Souza Silva, afirmou que o quadro feminino conseguiu o acesso
direto, de cabo a terceiro-sargento, por meio de uma mera portaria do então
ministro da Aeronáutica, Délio Jardim de Matos.
- Não existe nenhuma justificativa para
que os militares do sexo masculino não sejam contemplados com o direito à promoção.
A portaria é mais do que discriminatória, é inconstitucional – afirmou.
Outra distorção teria sido provocada
pela Lei 12.158, de 2009, que abriu caminho para que os taifeiros da
Aeronáutica – os taifeiros trabalham na preparação e distribuição de alimentos
- ganhassem o direito de serem promovidos até a graduação de suboficial na
reserva remunerada. No entanto, mesmo ocupando o mesmo patamar hierárquico, os
cabos das três Forças não contam com essa possibilidade de avanço. No máximo,
chegam a terceiro-sargento, levando 20 anos para alcançar essa posição.
Menções a Dilma
O presidente da Associação dos Militares
da Reserva, Reformados e Pensionistas das Forças Armadas (Amarp), Genivaldo da
Silva, salientou que emendas a uma medida provisória que tramita agora no
Senado atendem parte das reivindicações dos militares, inclusive a correção do
salário-família e do auxílio-moradia. Ele apelou para que o presidente do
Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), coloque a matéria em pauta e para que a
presidente Dilma Rousseff conserve as mudanças. Por sinal, Dilma foi mencionada
em diversos momentos da audiência, como alvo de pedidos de atenção e mesmo
críticas por suposta indiferença em relação aos militares.
- Falta consideração com a família
militar, com aqueles que defendem a soberania do Brasil – disse Genivaldo.
Para Ivone Luzardo, que preside o
Partido Militar Brasileiro, o argumento de que não há recursos para atender os
militares não é aceitável. Ela lembrou que para outros tipos de gastos o
governo não tem problema para arranjar dinheiro, inclusive, como lembrou, para
construir um porto em Cuba ou para perdoar dívidas de diversos países. Dito
isso, cobrou o pagamento integral e retroativo do reajuste de 28% ainda
pendente.
Esposa e filha de militar, a presidente
da Associação da Mulher Amarp, Miriam Cristina Dienstmann Stein, observou que
os militares da ativa não podem fazer greve nem têm o direito de formar
sindicatos. Porém, destacou que todos votam e precisam “ter voz, não podendo
ficar excluídos da sociedade”.
Ela ressaltou ainda a relevância da
missão militar na defesa do país, no suporte à população em catástrofes e até
mesmo na condução de obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).
Apesar disso, observou que as Forças Armadas não conseguem orçamento para seus
investimentos e a garantia de ganhos justos para seus quadros.
- Por isso, a evasão é muito grande. Bem
preparado, o militar vai fazer concurso e ser aprovado, abrindo mão do sonho de
ser militar em prol de um salário mais digno para manter sua família – disse.
Omissão
Kelma Costa, que preside a União
Nacional de Familiares das Forças Armadas e Auxiliares (Unifax), pediu a todos
para que mantenham o lema “fé na missão”, mesmo estando “esgotados”. Com
relação ao reajuste de 28,86%, ele observou que a questão se arrasta por 12
anos e nada se resolve. Disse que outras reivindicações já podiam estar sendo
negociadas, caso a pauta não estivesse obstruída com antigas questões.
- Infelizmente, a tropa está entregue a
um comando omisso, que não se preocupa – afirmou.
Depois de apresentar um contracheque de
um terceiro-sargento, no valor total de R$ 1.461,00, Kelma indagou como é
possível sobreviver com soldo tão reduzido. Queixou-se ainda da ausência de
ajuda de custo para moradia ou de acesso a um programa “Meu barraco, minha
vida”. Em contraste, ela lembrou que os soldados da Policia Militar de Brasília
vão ganhar R$ 7 mil mensais, como resultado da recente mobilização.
Kelma aproveitou ainda para mandar um
“recado” a presidente Dilma, a quem lembrou que a “família militar” é composta
de 5,2 milhões de membros. “Não somos um grupinho que surgiu em qualquer lugar,
não”, reforçou. A seguir, convocou as mulheres das famílias de militares para
que se organizem e lutem.
- Seus maridos não podem, pois está na
Constituição, mas vocês podem. A mudança começa nos seus lares –
Médicos cubanos
Acompanhou a audiência o deputado
federal Izalcir Luicas (PSDB-DF), oficial da reserva, que disse que os
militares estão de fato "sem prestigio” no governo. Segundo ele, há
“discriminação forte”, bastando ver os cortes no orçamento e a falta de
investimentos estratégicos. Observou ainda que o governo paga R$ 10 mil a um
médico cubano, “sem nenhum preparo”, um salário acima do previsto para
profissional da área em concurso aberto para o Hospital das Forças Armadas.
Logo em seguida, Paim apelou a todos
para que evitassem uma discussão partidária, observando que isso não ajudaria
em nada. Disse ainda que os problemas nas Forças Armadas são antigos,
atravessando diversos governo, de diferentes partidos.
- Queremos uma política de Estado para
as Forças Armadas, e não desse e daquele governo - disse.
O comandante da Aeronáutica, Juniti
Saito, participava no mesmo momento de audiência na Comissão de Relações
Exteriores e Defesa Nacional (CRE), para debater a aquisição dos novos caças
para equipar a Força. Ele, que havia sido convidado para o debate, junto aos
demais comandantes militares, justificou sua ausência por meio de um recado à
CDH e se colocou à disposição para receber a comissão que está sendo formada
para tentar abrir negociações.
Paim concedeu a palavra a diversos
militares da reserva presentes, entre eles o sargento Antonio da Silva Neto,
que se referiu ao quadro de penúria enfrentado pelos militares e lamentou que
chegassem ao ponto de serem obrigados a tratar publicamente desses fatos, o que
chamou de "expor as vísceras". Para ele, essa é uma situação
"completamente na contramão da coisa certa".
FONTE: AGÊNCIA SENADO
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